O Espírito do Evangelho
O Mestre sempre foi sério e objetivo, o que dá ao Evangelho o valor de um completo, perfeito e farto repositório de verdades sócio-evolutivas, embora envolvidas no simbolismo parabólico, dispensando os resumos como esclarecedores do envolvente, porque a nada leva, além da continuidade piegas do mítico e místico, face ao alicerçado no religiosismo prometedor e anestesiante.
Tudo, pois, que se queira saber concernente à evolução, vive e reside no espírito do Evangelho, desde que visto com “olhos de ver e ouvidos de ouvir”, o que se propõe como inteligência fundada na razão e consciência dos fatos.
É indubitavelmente de plena abrangência todo o desempenho comportável no sócio-vivencial na Terra pelo homem em função do homem, pois tange à fraternidade em seus aspectos gerais, destacando-se a lealdade, a honestidade, o auto-respeito (tribunal interior), a valorização da cultura como base de tudo e do trabalho, em que a inteligência se valoriza e responsabiliza.
Assim que, “ao ausentar-se o senhor (proprietário), deu a cada servo uma moeda e, ao retornar, deu mais ao que produziu menos, deu menos responsabilidade”, consoante narrativa evangélica.
Isto nos leva ao entendimento de que: ao que mais tem, mais se acrescenta, e ao que nada tem, deste se subtrai.
Partindo do raciocínio inquestionável de que do NADA, nada se retira e, estabelecendo-se relação com a história das “dracmas”, bem como, da valorização daquele que multiplicou a moeda pelo trabalho inteligente, deduzimos ser o que tenha mais capacidade, mais responsabilidade e, consequentemente, aurir os benefícios deste trabalho. Ao que não fez render, a este não se imputa responsabilidade, o que se entende por retirar o que já tem, pela demonstração de incompetência.
Superficialmente nos parece a citação do estabelecimento de “classes” mais ou menos beneficiadas, o que em verdade não o é, visto que: “foi posto por administrador sobre dez cidades e não lhe foi dado como propriedade” Lucas, 19:11.
Eis, portanto, a valorização do homem pelo que é, não pelo que possui, o que nos diz claramente de substituição do verbo TER pelo SER, valorizando a inteligência e não a posse.
A paz começa no estômago e tudo mais a complementa. É natural que isto nos ilumine quanto a uma nova era, em que a Terra será governada pela cultura científica como valor único e não pelas potências econômicas e a manutenção de seus poderosos arsenais atômicos, etc.
Nos termos de posse de valores culturais aquisições abstratas) não entra o competitivo para a superação e armazenamento, porque estas aquisições não se desgastam, não acabam quanto mais se doa, mais aumentam. Estas aquisições hão de subtrair os valores materiais concretos e se tornarão na meta útil do existir. O dia em que o homem entender isto, a paz começará no espírito e não no estômago.
Um país não vai à guerra porque seu inimigo possui mais cientistas, mais cultura, maior acervo de progresso advindos desses fatores. Vai sim, pela predominância do estômago, pelo que se compreende, tudo de grosseiro e transitório. Vai sim, porque ainda possui o sentimento bastardo da posse, sob todos os aspectos, “auridos nos princípios da razão em que seu defensivo era motivo de sobrevivência” e do qual ainda não se desfez.
Analisando a parábola
Na parábola das dracmas, vemos o cuidado pela multiplicação do acervo alheio e não próprio, refletindo o caráter confiável e não a ganância possessiva, em detrimento de outrem.
Vemos que a inteligência no seu padrão evolutivo real, requer honra, dignidade, confluindo para a responsabilidade, porque nasce do foro íntimo, o que fica demonstrado na parábola, pela ausência do Senhor (proprietário).
A parábola por força das circunstâncias, nos dá um “proprietário”, todavia, este representa a sociedade do futuro, que será regida pela hierarquia da inteligência esclarecida em termos da razão, da consciência e da responsabilidade.
A hierarquia no cômputo evangélico, não confere autoridade disciplinar modelar em códigos penalógicos, mas estrutura-se no ordenativo condutor do desempenho.
O grau de inteligência evolutiva, que comporta autodisciplina independente de impositivos exteriores, dispensa os referidos códigos penalógicos.
O Homem será perante si mesmo, um julgando em tribunal íntimo consciencial. O homem auto determinará sua liberdade e direitos em função dos deveres, até o limite onde iniciam os direitos alheios.
Eliminamos na parábola o direito de posse, visto que a liberdade aurida pelo servo adveio do bem administrar propriedade não sua, mas segundo o espírito de que constitui a história da sociedade. Isto nos ensina a respeito da inteligência aplicada, a rentabilidade superior ou valores do espírito e não do estômago.
Se o Evangelho nos concita a buscar o reino dos céus e dá a transitoriedade como acréscimo, por certo que todas as parábolas devem versar sobre este item, indicando o grosseiro e transitórios como facultantes a alcançar os valores superiores, é somente através daqueles que a humanidade chegará a estes.
Na parábola aprendemos que o servo desincumbiu-se de um encargo autoconcebido visto que, como os demais, apenas recebeu a moeda sem que fossem especificados os objetivos na ausência do proprietário. O servo que multiplicou a moeda indica uma capacidade existente, aliada à segurança da ação, sem abrigar a intenção de recompensa, porque ignorava se esta sobreviria.
Desde que não portava outro interesse senão a multiplicação, compreendemos a inobjetividade não do rentável exterior, mas do interior, extraindo do ato a felicidade de “viver no próprio ato”.
Esta parábola em seu espírito, estabelece estreita conexão com a do “grande julgamento” (Mateus 25:31 a 46) que deve também ser estudada para melhor compreensão de ambas. O Evangelho faz das coisas da Terra, propulsão para as coisas da Terra, não tenhamos a prática num específico sectário religioso, mas todas as coisas atinentes ao desempenho do homem em qualquer atividade.
Esta definição vem valorizar todo ato do homem em função da construção do céu interior por ele mesmo constituído.
Segundo a parábola, o servo fez o seu céu íntimo, na alegria da multiplicação do dinheiro, sem auscultar outro interesse com relação a sua pessoa. E quanto a responsabilidade, é o que entendemos por dever social de bem administrar o bem alheio.
Tem esta parábola a qualidade especial de enaltecer o trabalho profícuo com indícios ao bem comum, motivado pelo elevado senso de compreensão e responsabilidade e isto só pode acontecer com os que já têm possibilidade de autodeterminação. “Aquele que quiser vir após mim…” (Marcos, 8/;34 a 36). A cruz é no caso a da responsabilidade vertida pela moral individual, independente de qualquer insinuação exterior condicionante, e isto está provado na diferença de SENSO e PROCEDER entre os servos que receberam as moedas.
Fonte de vida íntima
Seria conveniente ao homem desvincular-se de sentimentos de: súdito, bajulador, de escravo por excelência, ou galé por princípios, que as religiões afiançam para que sejamos e, partir para a LIBERDADE de consciência como filho, fazendo dos seus atos, quaisquer que sejam, motivos de alegrias, fonte de vida íntima, no momento da ação.
Tendo sempre em mente ser um “relativo criado” por uma Inteligência Superior que sai o que fez, em sua capacidade positiva e limitações negativas.
O homem criado, em como o Criador, nada tem de sagrado, santo ou divino. Tudo absolutamente tudo, é no sentido real um fato normal do existir. O Evangelho prima por esclarecer isto em todas as suas parábolas, culminando com a expressão: “adorarão em espírito e verdade…” (João, 4:23) que entende-se como: “compreenderão pela inteligência a realidade dos fatos”, contra os quais não prevalecerão argumentos.
Valoriza assim, a cultura, o trabalho, o progresso sobre todos os aspectos, o que o caracteriza como universalista e genérico, nunca sectário e circunscrito, sob qualquer título.
Embora os sonhadores transcendentalistas sonhem, o realismo que os contradiz prossegue no seu curso evolutivo, indiferente e independente, rumo aos objetivos pré-determinados pela Inteligência Suprema, para sua criatura. Convém ao homem de bom senso ajustar-se às coisas e não pretender que as coisas se ajustem aos seus conceitos, porque continuará sonhando e perdendo tempo.
O homem não é uma marionete no palco da existência, manipulado pelos cordéis do capricho do Criador, mas um ser dotado agora, de razão e consciência que auto evolui, consoante seu estado relativo.
Os objetivos da Inteligência Suprema não se prestam a especulações. Uma análise nos levaria à conclusão de que não criou o homem relegando-o ignorante à sua própria sorte, para que errasse e fosse por isso castigado.
Todo ressarcimento e mais precisamente os descritos em seus horrores, desdouraram a supremacia da Inteligência, maculam os reais objetivos da Criação e conduzem o homem à negação de si próprio em termos de personalidade e filho.
Toda exposição evangélica é de espírito global, universalista. E mesmo que o discernimento (pelo imperativo de esclarecer) afine-se à unidade, não deve ser compreendido por esse prisma, mas sempre em relação ao todo e numa época, para que não venha tornar-se seletivista ou personalista, o que não é possível, em quesitos de evolução.
Assim, temos no “servo” disposto e inteligente que multiplicou a moeda naquela época, a inteligência desenvolvida, compreendendo como extrair o espiritual do material, sem tornar-se proprietário e sem prejudicar outrem.
Esta parábola deve ser estudada em conexão com a “das aves dos céus, que têm seus ninhos” (Lucas, 9:58) e veremos que relacionada com o “servo” ativo, é um paralelo ao estado de consciência de “filho homem que não tem como propriedade, uma pedra sequer”. Dessa época muito distante se apresenta o homem, visto que, a não ser o acúmulo transitório, nada o empolga, motiva ou demove.
Ainda que penetrado às coisas espirituais, não foge à voragem do acúmulo aquisitivo exterior, não cogitando se já é “filho do homem” ou permanece no estado consciencial de “raposa” ou “aves dos céus”.
A parábola das moedas (dracmas) esclarece de forma sucinta a não individualidade, a inobjetividade e o desapego que o homem deve ter, quando pela razão e consciência esclarecidas, saiba-se “filho do homem”.
Irmão Anthero
(recebido por via mediúnica)