Desde a sua introdução no Brasil, a Doutrina Espírita tem aumentado consideravelmente o número de seus profitentes e praticantes e, obviamente, refletindo na multiplicação dos centros, instituições diversas, sedes oficiais, etc. A Doutrina Espírita hoje, já conta com adeptos nos diferentes níveis sociais trazendo com isso, maiores responsabilidades na divulgação e sustentação dos seus ditames.
Hoje, no panorama mundial, podemos assinalar outro fato que deve despertar o interesse dos estudiosos do assunto, o surgimento de um grande número de novas doutrinas e seitas. Em algumas prevalece acentuado misticismo e em outras, um conteúdo doutrinário um tanto esdrúxulo com tendências ao fanatismo. Nas grandes potências surgem pregadores bíblicos dispondo de um forte poderio financeiro e utilizando-se dos meios mais modernos e sofisticados de comunicação, intercalando pregações com verdadeiros “shows” musicais de riqueza e colorido deslumbrantes. Por toda parte pontificam lideranças religiosas carismáticas, usando e abusando de ingenuidade da grande parte da população.
Não sendo, porém, nosso intuito a análise e a pesquisa das causas ou da geratriz desses acontecimentos, fazemos aqui apenas o registro do observado, deixando aos especialistas e estudiosos da matéria os encargos de uma avaliação séria e confiável.
É bem verdade que, por outro lado, não podemos ignorar o que está ocorrendo no seio de muitas denominadas religiões tradicionais onde surgem divergências de vários graus, desde o desejo de renovação, de atualização, da revisão de postulados doutrinários, até mesmo a insatisfação incontida de muitos adeptos, sobre os quais ocorre uma nítida perda de influência.
Numa visão mais abrangente, temos porém que admitir a verdade histórica de que o homem vai, aos poucos, libertando-se das injunções e dos condicionamentos que exercem acentuada influência no seu comportamento.
As variações que se verificam no procedimento social, cultural, econômico e até político atestam esse fato.
Naturalmente que são muitos os fatores determinantes dos quais, sem dúvida, é marcante a influência do avanço científico e conquistas tecnológicas decorrentes. Influenciando diretamente no homem, despertam novas indagações que exigem respostas convincentes, sem sofismas e alicerçadas em bases sólidas e comprovadas.
É dentro desse quadro, ainda que precariamente esboçado, que devemos analisar a Doutrina Espírita no Brasil, a qual terá sempre que ser estudada considerando-se a formação étnica, cultural e histórica do povo brasileiro com forte influência de raízes místicas e religiosas. Não obedece a uma diretriz única e diversifica-se em sua conduta doutrinária, práticas e cultos. Muitas divergências são de ordem superficial e estão mais ligadas ao ritualismo, que apesar de condenado por Kardec existe e prolifera.
Há, contudo, outras divergências mais sérias, mais profundas, porquanto atingem a essência doutrinária. Os órgãos oficiais da doutrina buscam reduzir suas dimensões e influências geradoras de desentendimentos, antagonismo à semelhança de um cisma. A tão propalada “unidade” é utopia, apesar da propaganda em contrário dos órgãos oficiais de comunicação espírita.
Para que a doutrina seja fortalecida será sempre necessário o exercício do debate, do diálogo democrático e a livre expressão do pensamento, em congressos, seminários, encontros, reuniões, etc.
Há que se evitar nos debates e explanações, os temas já exaustivamente discutidos desde há mais de um século, numa repetição monótona, inconcebível numa doutrina reencarnacionista com visos à evolução.
No campo do intercâmbio mediúnico corpóreo-incorpóreo, essas falhas são mais acentuadas e evidentes. A maior parte dessas comunicações constitui-se de mensagens dúlcidas, messiânicas, salvacionistas, religiosas, numa repetição cansativa e obstinada sobre os mesmos temas.
São mensagens que jorram abundantemente num proselitismo infantil que nada acrescentam às esferas do intelecto.
Outro fator negativo é a produção de uma literatura medíocre, de conceituações vazias de conteúdo, ainda que se constitua de sucesso na sua comercialização face à precariedade intelectual de grande parte do mercado consumidor. A “busca da verdade” aconselhada pelo Mestre Nazareno jamais poderá ser alcançada através dessa pseudo-literatura condicionante e modeladora, ainda que não seja degeneradora.
As comunicações resultantes do intercâmbio corpóreo-incorpóreo devem revestir-se de maior seriedade e profundidade, objetivando assuntos mais elevados e esclarecedores, sem a preocupação do proselitismo, do evangelismo superficial e dos prometimentos.
Dia chegará em que este intercâmbio e até mesmo a convivência entre os dois planos terão caráter normal, simples, sem essa necessidade de paranormalidade mediúnica, sem o ritualismo das mesas brancas e luzes apagadas.
O espírito-homem (desencarnado) e o homem-espírito (encarnado) são apenas estados transitórios nos quais o único diferencial é o corpo, o somático, porquanto os interesses são comuns.
Não deve prevalecer a aceitação “a priori” do exarado do espaço sem passar pelo crivo de uma análise racional. A tão decantada “fé raciocinada” não pode ser substituída pelo “amém”, que tudo aceita sem questionar.
Muito embora, em alguns casos a mecânica mediúnica seja autêntica, isto não confere foros de veracidade ao recebido da erraticidade, ainda que através de médiuns idolatrados e até santificados por muitos e de projeção no mundo espírita. A análise deve ser criteriosa, neutra, devendo-se levar em conta que nesse processo de comunicação, predomina de forma indiscutível a “lei da afinidade”. No dizer do nosso irmão Anthero “muitas comunicações advindas do espaço trazem ainda o cheiro da batina”.
O desencarne não dá a ninguém o saber e muito menos a sabedoria. As concepções cultivadas aqui continuam a prevalecer do lado de lá.
O próprio Kardec aconselhava a aceitação do recebido somente “a posteriori”, o que, infelizmente, nem sempre é seguido.
Hoje, felizmente, já existe um grupo de espíritas que busca novos horizontes dentro da doutrina. Não faz a crítica pela crítica e não se constitui em movimento de rebeldia, antes, de libertação. Esses espíritas buscam respostas mais concretas às questões fundamentais afim de atualizar a doutrina de maneira patente face às necessidades do hoje e não poderia ser de outra maneira. Se “a evolução obedece a um critério ordenativo inflexível” (Anthero), nada conseguirá deter sua marcha ascendente. Não serão as ações e as leis dos homens que irão suplantar os objetivos do Criador.
Tudo é apenas uma questão de tempo, nada mais.
O aflorar dos conhecimentos (evolução) obedece a um planejamento de ordem superior no qual até as minúcias são consideradas “…até os fios do seu cabelo estão contados”, “onde não prevalece o determinismo, mas uma lei lógica e material” (Anthero). O Mestre Jesus deu início à “era da inteligência” para iluminar os caminhos da humanidade submetida ao circunscrito místico – deusístico de interesse das minorias religiosas dominantes que, através da ameaça, dos castigos, ressarcimentos e provas, mantém a escravização mental do homem. Por outro lado, elas abusam da mentira dos céus e núcleos celestiais para a subserviência dos profitentes. A esse conjunto de estultices denominam “justiça divina”, numa afronta à bondade e à inteligência do próprio Criador.
O registro da história da humanidade está eivado de eventos que demonstram de maneira real, patente, que é pela cultura, pela ciência em todos os seus campos de atuação, pela valorização do trabalho, pelo esforço contínuo, pela dedicação, pelo desprendimento, pela cooperação sem fronteiras, que o homem vem superando os obstáculos e as dificuldades que encontra na construção da “rocha” com alicerce para seu avanço evolutivo.
Não foi, não é e não será através das religiões, das rezas, dos cultos e das práticas adoracionistas que a humanidade se evoluirá.
A humanidade terrena atingirá a “mansuetude” quando esta parcela (encarnada e desencarnada) circunscrita ao estágio reencarnatório do planeta, tiver consolidado no seu todo (a evolução é coletiva) o completo acervo de cultura, saber e sua resultante em sensibilidade pré-estabelecida para o orbe e passar a “conviver em perfeita compreensão, tolerância e cooperação, muito embora não seja este ainda o estágio máximo da evolução e do amor”.
O amor na sua essência será alcançado pelo espírito após bilênios de vidas sucessivas em planetas de graus evolutivos ascendentes e, após a desvinculação do círculo reencarnatório, quando então passará a “ser” em vivência íntima (“Eu tenho vida em mim mesmo” – Jesus).
A “herança da Terra não é o final da evolução, mas apenas a conclusão de uma etapa”, (“Na casa do meu Pai existem muitas moradas” – Jesus).
Não podemos olvidar que o desiderato do Pai é “um só rebanho e um só pastor”, do que, de pronto, se conclui do absurdo do elitismo religioso e da inutilidade dos atos infantis dos que se julgam “salvos” pelas práticas religiosas e outras. E também, dos que pela caridade objetiva e falsa humildade, muitas vezes utilizando seu próximo empobrecido pelas injustiças sociais, como degraus para sua ascensão espiritual numa pretensão tola, inconcebível e anti-fraterna.
A evolução é de ordem coletiva e, segundo o nosso amigo espiritual Anthero, questiona-se única e exclusivamente, em desenvolvimento intelectual no seu sentido lato cuja sensibilidade é uma decorrência da elasticidade da compreensão: a evolução adentra à pedagogia e não ao justicialismo”. Basta raciocinar.
Wilson Levy Braga da Silva
(excertos do Irmão Anthero e outros espíritos)