O falar é a expressão da própria personalidade. Tudo quando falamos traz o timbre do nosso interior, queiramos ou não. A própria modulação vocal indica o fundo moral, por isso é que quando falamos, precisamos ter a idéia amadurecida e sermos comedidos.
O falar traz a característica da própria alma. Quando o espírito é submisso aos desequilíbrios emocionais, por mais que tente sofrear inteligentemente no sentido de prevenir-se para não escorregar, eis que de repente, por força do hábito, advindo do seu próprio interior não corrigido, não devidamente reformado, diz aquilo que sente, que pensa e, às vezes, nem pensa o que diz. Assim, é elevada sabedoria medir aquilo que dizemos não no sentido frio, calculista e subjetivo querendo dizer o que não pretendia dizer, mas disse. A imposição do desequilíbrio emotivo demonstra bem, ser aquele espírito ainda desavisado, sujeito e escravo. Deve-se medir o que se fala, procurando por todos os meios conseguir a virtude do equilíbrio no dizer.
Devemos ser francos e firmes no falar, mas quando aquilo que dizemos é com convicção, já está analisado, amadurecido dentro de nós, já concluímos que se dissermos, será benéfico e não destrutivo, não irá ferir. Por quê? Porque a franqueza que destrói é perniciosa, a que fere é má, foge ao sentimento de compreensão, de amor ao próximo.
Cumpre, pois, a cada um aprender a enxergar com os olhos da mente, a deduzir dentro da pauta do raciocínio cristão.
Se o Mestre Jesus, frente a frente com a adúltera, fosse dizer francamente que ela estava errada, (porque estava) que havia pecado, (porque pecou) quem negaria? Em que situação estaria o Mestre no conceito da posteridade? Jesus era equilibrado no dizer, contudo procurava sentir e ver com os olhos da mente, da razão, nunca com os olhos físicos, nunca através das lentes opacas da emoção ou da concepção unilateral, própria.
Toda idéia não amadurecida e lançada, pode ser destrutiva. Imaginemos o próprio Mestre de dedo em riste, acusador: “Tu pecaste, mulher! Tu estás errada, embora eu não te condene, embora eu te perdoe!” Haveria amor nisto? Haveria amor em tocar fundo naquela chaga e fazer ressaltar naquela alma já ferida, a calosidade dolorosa do erro? Afinal, não chamamos Jesus de Mestre? Se ele é o Mestre e nos legou este magnífico exemplo de maturidade racional, dedutiva, por que às vezes nos arvoramos em críticas acerbas e impiedosas?
Supomos ser grandiosidade de caráter oprimir nosso irmão através daquilo que pomposamente alardeamos com franqueza. Teria Jesus sido condescendente, concordando com o erro da adúltera? Absolutamente não. Apenas ignorou, não se ateve ao fato que iria machucar-lhe a alma, ferindo profundamente aquela criatura que já estava ferida pela própria situação. Sentiu naquela alma as chagas doloridas. Por que então desnudá-las, expô-las? Simplesmente para prevalecer a franqueza? A verdade já existia, importava não encobri-la, mas compreender o motivo da sua existência, e Jesus compreendeu, como fazia sempre.
O Mestre limitou-se à atitude humana, benévola de educar, de fazer com que a própria pessoa, sentindo as chagas, as fizesse cicatrizar através de atos futuros: “Vai, não peques mais!” Porque não pecando mais, as úlceras deste pecado se cicatrizariam através de atos nobres, de procedimento de moral elevada.
Que fez Jesus? Deu oportunidade àquela adúltera de se ressarcir dos seus erros, sem levá-la ao tribunal da própria consciência. Temos feito isto?
Quem é Jesus? O que representa para nós? Será o símbolo de uma redenção quimérica, o Cordeiro de Deus sacrificado? Ou pura e simplesmente o Mestre? O exemplificador que nos legou lições vividas no exemplo? Só e tão somente!
Se o temos por Mestre, como nos arvoramos, às vezes, no sentido de uma leviandade em nome da austeridade?
Se a voz que sai pela boca obtivesse reflexo e penetrasse no próprio espírito de quem fala, encontraria motivos para a auto-recriminação, porque só o fato da crítica desapiedada, no sentido oculto, bastardo, inconcebível da capciosidade de ferir o próximo, já constitui em si o motivo para outra crítica, a de si mesmo.
Por acaso teria Jesus faltado com a verdade para consigo mesmo, traído a sua própria consciência? Não teria tido a necessária autoridade e altura moral ao proceder como procedeu com aquela adúltera?
Mas, Jesus era Jesus! Então não o chame de Mestre. Não minta a si próprio, não busque no dizer apenas, chamá-lo de Mestre, conhecer suas lições e praticá-las só no sentido de conveniência pessoal. Não.
É preciso conhecer as condições para viver as lições recebidas. Por que não proceder assim sempre? Por que não meditar antes de dizer alguma coisa, para que não se transforme em algoz, não em juiz, para que não seja, por vezes, carrasco que vem executar, destruir, matar através da arma poderosa da palavra, da crítica acerba, o entusiasmo, o desejo de realização, a força construtiva?
Alguém poderá dizer: “Então não devo criticar meu irmão quando não estiver certo o seu procedimento?” Sim, perfeitamente. Achegue-se a ele, ofereça os seus préstimos, penetre no sentido da humildade, da cooperação e, aos poucos vá fazendo-o ver amorosamente, que o caminho tomado sendo outro… Exemplifique. Dará melhor resultado. Fale com amor, com o trabalho, com a cooperação e desprendimento. Então sim, você poderá chamar Jesus de seu Mestre. Por isso é que sempre ao dizer, devemos parar, pensar, analisar, buscar o fundo da expressão, buscar no Evangelho o molde exato em que ela se encaixe. Se não encontrarmos, silenciemos.
Devemos meditar e analisar mais, evitando assim uma crítica que, por vezes, em que pese o desejo de franqueza, do positivismo dilacerante, mas devemos imitar Jesus, irmos em busca de soluções junto à criatura, com amor, carinho, dedicação, exemplificando no terreno da humildade. É mais fácil ser um herói do que um covarde. A covardia, no caso, chama-se humildade e o heroísmo, violência do verbo.
É muito mais difícil nos acovardarmos da humildade pondo freios inclusive no nosso sentir, porque se a palavra fere e destrói, não menos acontece com os sentimentos, com as vibrações emitidas de cada um de nós.
A emissão de pensamentos torvos, de crítica, onde prevalece o cúmulos da maldade ou da ignorância, vale tanto quanto ou mais do que a palavra, portanto, não basta silenciar a boca, é preciso varrer no cadinho das emoções esta escória, deixar que esta fusão metálica seja viva, limpa, perfeita num sentido de junção e firmeza.
Quantas vezes verdadeiras paredes existem no tocante ao silêncio, emitindo raios mortíferos contra o seu irmão! Então já não basta silenciar, é preciso calar a voz interior, reformar-se, pôr freios muito mais ao nascedouro da palavra, do que à própria palavra. Não adianta iludirmos, parecer humildes, verdadeiros “zelotes” do amor, se temos um ninho de víboras no escaninho da própria alma. Deus não ouve as expressões levianas, o vento as leva. O que o Criador sente, percebe, vê, analisa é o interior, é de onde nascem os males, portanto, convém amadurecer os pensamentos e os sentimentos.
É preciso que cada um vá limpando de dentro de si mesmo os maus sentimentos que vive e vibra, e neles não interfere a razão porque ainda fazem parte integrante do seu próprio ser.
O invejoso não tem consciência de que sente e vive a inveja; não toma conhecimento através da razão se está praticando o bem ou o mal. Ele apenas vive a inveja, e o maledicente faz da maledicência até o diletantismo, mas não tem consciência do que está fazendo, e isto é natural, sobrevém de chofre, inesperadamente, porque está na raiz. Portanto, importa a vigilância, o despertar da razão para o domínio dos sentimentos vulgares.
Quando o rancor vem, o ódio não consulta a consciência e a razão de ninguém. Eclode repentinamente dando os seus frutos destrutivos, porque se o espírito estivesse vigilante, e no momento da eclosão vulcânica do ódio, tivesse a necessária força da razão para dizer não, haveria assim a primeira contenção, no amanhã a segunda, depois a terceira e assim, o domínio absoluto daquele sentimento que caracteriza o espírito retardatário na jornada do progresso.
Por que nos sentimentos não intervém a razão? Na vida sensorial a razão não impera, pois quem ama e vai até o sacrifício, desconhece isto, vive apenas aquele sentimento ignorando a razão do “porquê” do amor.
Aquele que vibra sentimento de paz, harmonia e maturidade espiritual, não o faz através da razão, mas porque ele já é assim. Imaginemos a pessoa fazer os cálculos racionais e meditar sobre o amor. Amar ou odiar através da razão é impossível. Contudo, se for necessário, podemos alijar até o próprio amor ou qualquer outro sentimento como: o ódio, a inveja, a vaidade, a crítica acerba, o desajuste mental.
Tudo pode ser coibido, modificado, limpo, arejado, através da vigilância da língua e do sentimento, e isto não se faz em alguns dias, mas sim com aquela vontade férrea de se tornar discípulo de Jesus, encontrando todos os dias pela frente, a mulher adúltera, símbolo do pecado, vivendo em contraposição a atitude do Mestre, o símbolo do amor e da pureza.
O importante é experimentar, é fugir da teoria que não penetra na prática e não dá um sentido positivo, é teoria falsa, digna de ser substituída. O que não se comprova na prática, não pode ser uma teoria com que se afiance. Vamos experimentar, porém não prometendo para si próprio que amanhã irá tentar, porque tentar é duvidar de si mesmo e, quem duvida de si mesmo, não pode aceitar com confiança o próprio amor de Deus. Se duvida de si, como terá fé em Deus?
Será que alguém é capaz de se esforçar a tal pondo de poder dizer: “Meu Mestre é Jesus porque, apesar dos pesares e das limitações que a existência me impõe, eu vivo as lições de Jesus em qualquer âmbito da existência: no lar, no convívio com os amigos, com aqueles que me são simpáticos, com os que eu pensava que eram antipáticos, mas em quem eu não via senão o mal porque só sabia ver com os olhos físicos, só deduzia sem uma razão amadurecida, era cego, não compreendia que eles são meus irmãos, iguais a mim. Tenho que suportá-los. Jesus não suportou a adúltera?”
Não olhe mais para um irmão observando-o pelo seu lado podre porque estará desmoralizando o próprio Deus, a sua própria pessoa, pois ele é seu irmão. Se você só vê podridão e não procura nada de bom, é uma vergonha para si mesmo. É utopia.
Jesus, mesmo sentindo que a posteridade o interpretaria de diversas formas e maneiras, percebendo a vanguarda do tempo, as interpretações heterogêneas, desconcertantes, desajustadas, houve por bem legar inteligentemente sua doutrina numa síntese, num termo completo em poucas palavras: “Amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Não custa experimentar e viver estes dois mandamentos isto é, não custa para aqueles que são predispostos, aqueles que têm consciência do que estão fazendo quando encarnados, para aqueles que sabem perfeitamente que ninguém irá, de forma alguma, abrir-lhe a porta, convidá-lo para passar e curvar-se cortesmente para que ele o faça.
Qual é o outro caminho que conduz à elevação espiritual senão este? O amor ao próximo não nasce da noite para o dia. Convém que se lhe antecipe vários escalões da espiritualidade. O primeiro é o desejo férreo de conseguir sentir amor pelo próximo. É o ponto de partida, sem o qual tudo isto e o que se vem falando há mais de dois mil anos, é nulo. Em segundo, é conseguindo aproximar-se do amor através do auto-domínio cotidiano. O importante é começar nunca duvidando de si na tentativa, nunca duvidando de Deus esperando que não procedendo assim, o Pai se condoa e venha traçar um outro caminho.
Portanto, quando falarmos, tenhamos aquela figura magistral do Mestre e a pecadora à sua frente, ao ponto de Jesus perguntar: – “E os teus acusadores onde estão? – “Se foram, Mestre”, respondeu a adúltera.”
Triste papel! Vergonhoso! Mas, este papel é sempre vivido pelos acusadores levianos, incoerentes, inconseqüentes, maledicentes e invejosos, na repetição da história no âmbito cotidiano. Triste papel porque o bom senso, a vigilância eterna, perene do Mestre lançou-lhes de maneira irrefutável, uma arma da qual não puderam se defender, colocou-os numa alternativa de: ou vive a hipocrisia, ou afasta-se. Se alguém tentasse atirar a primeira pedra, daria a mais perfeita e insofismável demonstração de elevado grau de hipocrisia.
Que este alerta possa reavivar na mente de cada um a necessidade imperiosa e inadiável de buscar a si mesmo no campo da superioridade espiritual, lembrando sempre de que o Evangelho pode ser escrito em uma única linha: “Amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”.
(recebido por via mediúnica)