36 – Virtudes

Parte I

Quando Jesus fala em vigilância, refere-se exatamente à crítica diária que a criatura deve fazer sobre os seus atos. Entretanto, há pessoas que descuidam disto e têm, por vezes, a vaidade de fazer um autoconceito elevado, envolvendo-se de tal maneira nesta concepção, que ultrapassam o terreno da realidade, fugindo ao bom senso. É necessário manter sempre um teor de disciplina mental atuante , prevalecendo esta autocrítica e, à noite, antes de acomodar-se, preparar-se e fazer a contabilidade diária.

É preciso examinar, por assim dizer, os rendimentos do trabalho diário no que concerne ao seu aprimoramento interior e, pode ser que o autoconceito seja justificável e aceito. A repetição constante destas atitudes  de vigilância forma o que chamamos de hábito, o costume de a cada instante ter a precaução de conceder mais um crédito à sua contabilidade espiritual, e nisto concerne sempre o princípio elementar no progresso do espírito.

Se não partir do começo, nunca se atingirá um grau mais elevado e, como pensar em estar num grau espiritualmente elevado, se não se conhecer os primeiros degraus, os princípios simples na vida do dia-a-dia, as horas que se sucedem durante a vigília, sempre com precaução no contato com o outro e não contra ele!

Tenhamos cautela conosco mesmos, pois quantas vezes deixamos este cuidado e criamos situações embaraçosas e desnecessárias! Não existe situação que requeira da pessoa uma atitude desconexa, desavisada. Todas as questões que surgem durante a existência, se observadas sob um ângulo mental ajustado, equilibrado, podem ser solucionadas através de uma atitude condizente, calma, sem passar por esta expansão que desequilibra, desajusta e desnivela as vibrações interiores. Tudo pode ser solucionado dentro da calma, da paz, do bom senso individual. Isto é necessário ao chamado espiritualista, ao evangelizado, porque uma coisa é preciso ter em conta, se analisarmos bem o Evangelho de Jesus, vamos perceber de pronto, que ele não desassocia, de forma alguma, do proceder diário.

Nas confraternizações que acontecem nos Templos religiosos em que se trocam beijos e abraços fraternalmente, isto é conviver entre si com pessoas “iguais”. É uma confraternização, não há dúvidas, mas o importante é consolidá-la com as demais criaturas que desconhecem o Evangelho e que ainda estão, no dizer comum, semi-animalizadas pelas coisa terrenas e apegadas às coisas  menores. Neste momento é que é necessária a intercessão do Evangelho interior, aquele que mora na pessoa, que faz parte integrante da natureza deste espírito. Se o Evangelho de Jesus pudesse ser vivido à parte do dia-a-dia, seria uma coisa extraordinária, pois durante o dia o menosprezaríamos e à noite, dentro dos templos, em horas determinadas, viveríamos em cantos de amor, em orações.

O Evangelho de Jesus é composto de degraus de moralização interior que uma pessoa transmite a outra. É conquista diária e própria. É ter respeito e honestidade consigo mesmo. É ter um sentido intrínseco, penetrante, remodelador. A raiz evangélica é plantada do amanhecer ao anoitecer de cada um. Sem esta raiz, como chegar à sua florada? O Evangelho do amanhã começa hoje.

Parte II

A virtude é prenda que se cultiva, não se ganha e nem se compra. Não advém de Deus, como também nenhum ato praticado com a intenção de adquiri-la poderá trazê-la. A virtude nasce da vontade do espírito, do esforço constante, diário, para sua aquisição. Aquisição quer dizer: cultivo, verificação da virtude no íntimo de cada um. Portanto, as pessoas deverão sempre fazer o possível para viver entre si uma perene confraternização, não sé dentro de um Templo religioso, como também com aqueles necessitados do pão do espírito. Não quer dizer que se deva ocultar a virtude, pois ela por si só se demonstra através dos fluidos de atração e de simpatia dominantes, se é que se pode usar esta expressão. Criaturas negras, portadoras de deficiências, leprosas, cuja aproximação nos escraviza, nos domina e, entretanto, existem verdadeiros expoentes de beleza física de ambos os sexos, que nos repugnam, não no sentido de menosprezo, mas que nos afugentam, não têm domínio sobre nós porque nelas não fala a alma, por ser absolutamente vazia de virtudes.

Ao praticar um ato bom, a criatura já está devidamente preparada e convertida num espírito capaz de sentir naquele ato a naturalidade de um gesto tal como cheirar uma flor ou tomar um copo d água, dizer bom-dia a um amigo, ouvir a risada de uma criança, olhar um pássaro que transpõe voando o espaço, com toda naturalidade. A prática do bem como sendo parte da rotina diária de cada um, é como ler um livro ou sentir o entusiasmo no encontro com uma pessoa querida.

O ato tem que ser praticado como sendo parte integrante do nosso viver. Desta forma, não mais se pensará em recompensa, porque este ato da prática do bem é uma complementação da educação interior e, como resultado deste esforço educativo, a prática da “caridade” consigo mesmo com reflexo no seu semelhante. Não buscar na causa que transporá para si o efeito de se tornar caridoso, é o mesmo que plantar a árvore de cabeça para baixo, não tem raízes. Chegamos a uma conclusão, que a verdadeira caridade tem o seu nascedouro no sentimento de cada um, tem a sua semente no espírito. Temos que concordar, queiramos ou não, que não podemos alterar, pois é a única operação cuja alteração dos termos pode variar os resultados, porque torna-se um vício e o espírito torna-se irresponsável quanto a sua própria condução interior.

Se a pessoa não tem nada para dar, que sentimento abriga dentro de si? Será capaz de olhar uma criatura que lhe ofende, com aquele sentimento de compreensão, de doçura? Será ela capaz se sentir a verdade evangélica da bofetada no rosto? Não é bofetada física, mas o espírito de tolerância. Você se educou? Já tem isto cultivado na sua alma? Já é essa virtude? Aí entra a vigilância, a autocrítica e, se respondeu áspero a alguém, faltou com a caridade para com você mesmo, perdeu a oportunidade de educar-se, de sofrer tranquilo aquela ofensa, de silenciar  e retornar àquela pessoa com tolerância, com calma. Esta é a maneira de ir conseguindo o equilíbrio magnético do espírito, não com a intenção de agradar a Deus, porém com consciência de aproveitar a oportunidade para a educação fora dos Templos, dos Centros de trabalho, longe daqueles que o conhecem porque sua aproximação já injeta no ambiente uma vibração de equilíbrio e, todos que se aproximarem, sentirão que do seu interior, algo superior se irradia no eflúvio de docilidade e dominação.

Isto influi na tonalidade da voz, por incrível que pareça, não que seja uma voz poética. Às vezes a pessoa fala com timbre de voz firme, mas nela denota-se de imediato, a pontualidade de expressão, de fluido e de espírito equilibrados. Assim, são raras as oportunidades desta criatura sentir a ofensa, e raras também as oportunidades de atirar-lhe pedras porque percebe o vigor daquela dominação interior e a bondade que se irradia. Isto não é esmola de Deus a ninguém e nem advém de atos exteriores, porém do vigor empregado na autoconcentração, no despertar da consciência de que a pessoa “é” porque “é”, e não no título de espírita ou reencarnacionista, ou missionário.

Tudo advém do esforço diário da criatura de querer e ser, praticando aqui na Terra, onde existem pessoas de todos os tipos, constituindo cada uma delas uma oportunidade de auxiliar aquele que quer educar-se. São verdadeiras promotoras da evolução daquele que quer evoluir, com o cuidado de não resvalar na vaidade ou na superioridade.

O processo é o mesmo para com a caridade, cujo ato não deve constituir uma obrigação. Se a pessoa tem motivação intrínseca, se não vive este ato no seu interior, ele será apenas social.

Outra virtude é a paciência. Sem ela as criaturas são um joguete das emoções desordenadas, são desequilibradas, necessitam de educar-se emocionalmente, pois a  paciência é o alicerce do edifício de virtudes de muitos andares.

 

Irmão Anthero

(recebido por via mediúnica)